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Quem irá defender os CEOs de Sérgio Moro?

Até três anos atrás, o pacote clássico de contratação de qualquer executivo de primeiro escalão incluía, além dos benefícios de praxe, um seguro do tipo Directors & Officers, mais conhecido pelas iniciais D&O. Destinada ao topo das companhias, essas apólices protegem os profissionais em casos de processo por responsabilidade civil, nas quais os executivos podem ser acionados judicialmente por atos praticados no exercício do cargo por concorrentes, investidores e, mais recentemente, autoridades.

Após a Lava Jato, porém, esse mercado mudou. A dinâmica da operação Lava Jato e a severidade da caneta do juiz federal Sérgio Moro mandaram executivos de primeiro escalão para trás das grades. Com isso, as seguradoras elevaram os preços dessas apólices e reduziram o escopo da proteção. Algumas delas avaliam até retirar os produtos de suas prateleiras. Dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep) mostram que em 2014, quando a Polícia Federal deflagrou a Lava Jato, as indenizações pagas para quem tinha apólices D&O cresceram 234,1%, para R$ 129,3 milhões. Em 2013, esses pagamentos, conhecidos pelo nome técnico de sinistros, haviam sido de apenas R$ 38,7 milhões. Já em 2015, o número foi catapultado a R$ 141,3 milhões.

Na prática, um executivo que quiser contratar uma D&O ainda encontra o produto disponível. Porém, a cobertura para alguns setores, como infraestrutura e construção, se tornou mais escassa, restrita e cara. “O D&O está em crise e as seguradoras não estão preparadas para pagar tantas indenizações”, diz o advogado Ernesto Tzirulnik, especialista em direito securitário. “Elas estão criando barreiras e dificultando pagamentos para reduzir seu prejuízo.” Para ele, os dias de altas margens do produto ficaram para trás. “As seguradoras não formaram reservas financeiras adequadas para essa demanda de sinistros”, diz ele. “Espero que o Judiciário corrija essa distorção.”

Tzirulnik conhece a situação de perto. Seus clientes têm US$ 200 milhões em indenizações a receber que, por vários motivos, terão de ser discutidas com as seguradoras na Justiça. O produto não é padronizado e há cláusulas que dão margem a diferentes interpretações. Como o País não possui uma legislação específica, o espaço para questionamento é grande. “Quando uma apólice tem o sinistro negado, normalmente é porque a apólice não estava adequada”, afirma André Dabus, diretor executivo da AD Corretora. Caso a investigação do Ministério Público comprove o pagamento de propina ou práticas de lavagem de dinheiro, por exemplo, a empresa segurada pode perder a cobertura do D&O.  “A condenação na Justiça por um ato doloso abre o precedente para que a seguradora não pague o sinistro”, diz Leandro Freitas, gerente de Financial Lines da MDS Insure.

Quem conhece o setor afirma que esse é o caso de empreiteiras como Odebrecht e Camargo Corrêa. Marcelo Odebrecht está preso há mais de um ano, e Dalton Avancini, ex-presidente da Camargo Corrêa, foi condenado a 15 anos de prisão em 2015. Também é o caso da Queiroz Galvão, que teve dois executivos indiciados, mas ainda não condenados. Nenhum deles conseguiu receber integralmente suas apólices. Todas elas tiveram problemas para receber. Procuradas, Camargo Corrêa e Queiroz Galvão não comentaram. Já a Odebrecht informou, em nota, que “não moveu nenhuma ação judicial contra seguradoras referente a seguro de Responsabilidade Civil (D&O) e reforça que mantém parcerias de longo prazo com o mercado segurador.”

Além da Lava Jato, as recentes ações coletivas movidas por investidores americanos contra empresas brasileiras com ações negociadas nos Estados Unidos – caso de Vale, Gerdau, Petrobras e Bradesco – também devem salgar a conta das seguradoras. Mas, neste caso, cabe ao acionista comprovar que a perda de valor de uma determinada ação foi provocada por negligência ou pela má gestão do administrador da empresa. De acordo com Celso Soares Jr, diretor da Zurich Seguros, as empresas que emitiram American Depositary Receipts (ADR), títulos americanos lastreados por ações brasileiras, têm essa cobertura. As apólices em geral incluem o custeio de despesas com advogados no exterior e até mesmo as multas aplicadas por órgãos reguladores. Segundo Soares, a cobertura dos eventuais gastos com advogados de defesa no Exterior varia de 0,8% a 5% do valor total do seguro contratado. Em caso de processo, essa fatia pode chegar até a 10% do total da apólice.

Os profissionais do mercado de seguros não gostam muito de falar em números, mas o valor da indenização das apólices que envolvem executivos de empresas com ações listadas no mercado americano pode chegar a R$ 100 milhões. O valor da franquia é estipulado na hora da contratação, uma vez que as apólices são personalizadas de acordo com a proteção desejada pelo contratante. Como as apólices são muito específicas e suas coberturas mudam muito de acordo com a necessidade, não é possível comparar os preços. “As apólices já estão mais caras e as seguradoras estão mais cautelosas na aceitação de riscos porque a conta tem que fechar. O valor do prêmio é proporcional ao risco. Ninguém esperava por isso há dois anos”, diz Leandro Freitas, gerente de Financial Lines da MDS Insure.

Normalmente, a seguradora que vende a proteção compartilha os riscos com resseguradoras, o que causa um efeito em cascata em casos de haver a necessidade de pagar indenizações elevadas. O período de cobertura, assim como as cláusulas de proteção e exclusão das apólices, varia. “Tudo depende da cobertura contratada, mas é usual que a apólice D&O tenha de dois a três anos de vigência, além do ano de contratação, podendo ter uma cobertura adicional após esse período, caso a apólice não seja renovada”, explica Dabus, da AD Corretora.

Fonte: http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/investidores/20160722/quem-vai-defender-ceos-sergio-moro/395752