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Precisamos falar sobre redução e devolução parcial dos prêmios de seguro

Por Inaê Oliveira

Mundo afora, seguradoras começaram a reduzir prêmios, inclusive com devolução de valores já pagos, nos seguros em que os riscos cobertos diminuíram em virtude das políticas de contenção da pandemia de Covid-19. Pense-se, por exemplo, nos seguros de automóveis, cuja circulação está drasticamente reduzida, com isso tendo diminuído o risco de acidentes, furtos e roubos, ou nos seguros de riscos operacionais para fábricas que estão ou estiveram fechadas, sem atividade, por força de atos administrativos, como os Decretos Estaduais 64.881, em São Paulo, e 55.154, no Rio Grande do Sul.

Como consta no comunicado mais recente da Associação Internacional de Supervisores de Seguros (IAIS, na sigla em inglês), datado de 7 de maio, da qual tanto a Superintendência de Seguros Privados (Susep) quanto a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) são membros, essa não é uma iniciativa isolada, adotada espontaneamente por uma ou outra seguradora, ou exigida por uma agência reguladora específica. Mais do que bem-vinda, é uma medida necessária que vem sendo amplamente adotada.

O trinômio interesse–risco–prêmio é o núcleo do contrato de seguro. Tal qual uma reação química que, para estar em equilíbrio, precisa que reagentes e produtos se mantenham constantes ao longo do tempo, no seguro a equação entre interesse, risco e prêmio precisa se manter equilibrada. Desde antes da etapa de formação do contrato, o risco que incide sobre os interesses seguráveis é aferido e precificado. Tem-se, assim, o prêmio de risco, ao qual se somam os chamados carregamentos, especialmente as despesas com intermediação, formando o prêmio comercial, que é a quantia efetivamente paga pelo segurado.

Na etapa de execução, caso o risco aumente, há o chamado “agravamento de risco”, que poderá ter consequências diversas, conforme seja intencional, com culpa, sem culpa, ou derivado de ato de terceiro ou fato da natureza. Por outro lado, caso o risco diminua de modo considerável, o segurado pode exigir a revisão do prêmio ou a resolução do contrato nos termos do artigo 770 do Código Civil. Trata-se de um direito do segurado.

Naturalmente, caso cada segurado tenha que demandar, em juízo, a revisão do prêmio, o custo da judicialização será enorme. Além disso, o incentivo para ações individuais é pequeno, sobretudo nos chamados seguros de massa. Como relatou o Financial Times, ao noticiar a decisão da galesa Admiral, uma das primeiras a restituir prêmios nos seguros de automóveis, a seguradora devolveria, em um mês, cerca de 110 milhões de libras em prêmios – 25 libras por apólice, em média.

Como o incentivo para a ação individual é pequeno, mas o impacto sistêmico é grande, o ideal seria que as seguradoras atuantes no mercado brasileiro fossem proativas, assim como suas congêneres estrangeiras, ou que, na falta disso, as autoridades públicas apontassem o caminho. Em Portugal, por exemplo, o Conselho de Ministros aprovou, em 7 de maio, um decreto-lei que trata, dentre outras coisas, da devolução dos prêmios nos casos em que o risco coberto diminuiu em decorrência direta ou indireta das medidas legais de resposta à pandemia.

No Brasil, caso as seguradoras se omitam, e as agências reguladoras também, o combalido Poder Judiciário, já assoberbado por demandas relacionadas à pandemia, eventualmente precisará ser chamado a atuar. A litigiosidade, provável rebento da inércia, viria em prejuízo de todos. Em tempos de pandemia, mais do que nunca, as seguradoras precisam desempenhar ativamente a sua função dentro da sociedade.