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Contratos de seguros merecem regulamentação

Ernesto Tzirulnik
Presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Seguro

É boa hora para falar sobre o futuro do Direito do seguro no Brasil. Está adiantada a tramitação no Senado da primeira Lei de Contrato de Seguro brasileira.

Em um mundo no qual a proliferação de novidades frequentemente supera os limites da convivência desejada, as relações negociais, mais que nunca, precisam de segurança jurídica. O Brasil é hoje exemplo nítido da insegurança institucional e social. Para lidar com isso, além da boa governança das empresas e do Estado, é essencial um ordenamento jurídico que regule sobre a essência dos negócios, de forma compreensível.

Isso se aplica aos negócios jurídicos em geral e os seguros precisam de estatutos ainda mais claros. É necessário que os contratos de seguro possam ser regulados com atenção ao mercado internacional, não para reproduzi-lo, mas para valer-se dele com as vacinas necessárias, prevenindo desvios e abusos. Os resseguradores internacionais, dominantes num mercado que tem claros limites subjetivos, e poucos players, tendem naturalmente a esperar que tudo se organize segundo as suas próprias razões técnicas, jurídicas e culturais.

Por esses motivos os países procuram regular o negócio securitário por meio de lei especial sobre o contrato de seguro. Raramente se conjuga a regulação do contrato e a da atividade seguradora, como a França, que tem um imenso Código de Seguros. Mais raros os países que cuidam desses contratos nos códigos civis e comerciais, como Colômbia e Paraguai.

A necessidade de lei especial de contrato de seguro não é uma novidade, nem corresponde a tendência ultrapassada. A Alemanha tem Lei de Contrato de Seguro desde 1901 e editou outra em 2007. A Bélgica tem lei de contrato de seguro desde 1895; em 2014 editou nova lei. A Itália produziu a sua em 2008. Luxemburgo em 1997 e o Japão em 2008. Portugal outorgou a sua em 2007 e teve por base dois projetos, o alemão e o brasileiro. Até o Reino Unido, onde são raras as leis escritas, editou sua lei especial em 2015.

No Brasil, a comunidade de juristas reclama uma lei especial sobre o contrato de seguro há décadas. A matéria é regulada pelo Código Comercial de 1850, pelo Decreto-lei nº 73/1966, e pelo Código Civil de 2002, que contém regras elaboradas nos anos 1940 e 1960; e chegou com atraso e retrocessos. A ausência de uma boa lei levou o Brasil a ter um sem número de normas, feitas sem os cuidados com que se elaboram as leis. Um verdadeiro caos.

É necessária uma lei para reunir as normas esparsas, consolidá-las e harmonizá-las num só diploma, compatibilizando a linguagem normativa securitária com a geralmente utilizada nos textos legais, tornando fáceis de serem compreendidas as principais regras, para a proteção dos segurados e das seguradoras, disciplinando a natureza consensual e de adesão dos contratos de seguro, e incorporando os avanços do Judiciário e da técnica seguradora, sem encamisar as operações, permitindo que elas se desenvolvam com razoável liberdade.

Em maio de 2004, o Congresso Nacional passou a discutir o projeto daquela que seria a primeira Lei de Contrato de Seguro brasileira. O anteprojeto foi escrito no Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS). É o Projeto de lei nº 3.555/2004. Constituiu-se, sem dúvida, um dos principais textos dessa espécie dos anos 2000. Incialmente apoiado pelo IBDS, pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BrasilCon) e pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), o projeto conquistou o meio empresarial, recebendo apoios da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e da Confederação Nacional das Indústrias (CNI). Em 2015 e 2017, a Confederação Nacional das Empresas de Seguros (CNSeg) e a Federação Nacional dos Corretores de Seguros (Fenacor) empreenderam com o IBDS um texto comum que acabou sendo aprovado pela Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei da Câmara nº 29/2017.

Atualmente o Projeto se encontra na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Uma vez aprovado sem alterações, seguirá para a sanção presidencial. Do contrário, será necessário reinventar a roda na Câmara dos Deputados.